Jaipur parte II: Let’s take a bus

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“Let’s take a bus.” Anunciou Tâmara que estivera toda a manhã bebendo com uma amiga até alguns minutos antes do nosso encontro .

Depois de perder o trem essa era nossa única opção. Alem do mais nossa segunda locomotiva sairia de Delhi em 8h30 horas apenas trinta minutos   do tempo que gastaríamos para chegar lá de ônibus.

Pegamos um riquixá direto para a estação de ônibus.  Lá o cobrador anunciou que o próximo ônibus chegaria a Delhi as 00h exato momento em que nosso trem para Jaipur partiria de sua estação do outro lado da cidade.

Tâmara, ainda alta , era só positividade, eu, que havia passado toda a manhã corrigindo provas, nem tanto:

– We need to think positive, because what we think, we atract.

– Tâmara, usually, when I listening this kind of thing, I pretend I take it just to do not harm no one’s feelings, but actually I think this is all  a huge bulshit. We gonna loose this train.”

– This is the kind of thinking that gonna make we arrive late. We need to think positively.

– I may should have smoked as well.

– You see. You should. You would be much more positive now.

Sorrindo:  “Let’s take this bus”

Partimos para Delhi e como manda a lógica não alterada por drogas ou autores baratos chegamos ao nosso destino a 00h20. Próximo ônibus em meia hora. Tempo o bastante para usar o banheiro mais nojento, insalubre, porco, e mais uma vez, nojento que já experienciei em toda a aminha vida. A falta de água propiciou o acumulo de detritos humanos em cada um dos sanitários, paraíso de moscas, mosquitos e outros seres voadores que fizeram do espaço um lar. Saio de lá com a sensação de que preciso de uma piscina de álcool gel. Inder compra batatinha e refrigerante: “No thank you”

Nos acomodamos no desconfortável e apertado ônibus com seus duros bancos de três lugares recobertos por uma fina camada de estofado e lona plástica. Abro a janela, uma longa viagem de mais 8 horas nos espera.

Aeroporto, turbantes, buzina e vacas.

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Acho que a melhor impressão, a mais vívida, sobre um lugar é a de quando você pisa pela primeira vez em terras estrangeiras. Especialmente quando a tal terra estrangeira fica do outro lado do mundo e possui uma cultura completamente diferente da sua.

Tudo é novo o cérebro e todos os seus sentidos entram em frenesi com tanta informação. Você está cansada da viagem. Você não fala a língua local. Não sabe como encontrar o ônibus, pegar um táxi. E agora? O que eu to fazendo aqui?

Quando pisei no aeroporto de Nova Delhi as 4 da manhã, após dois dias de viagem com direito a escala de de 23h na Turquia e uma diferença de 7h30 no fuso horário, senti um forte cheiro de curry, de comida indiana, de especiarias misturado ao cheiro das pessoas na fila. “Deus ajude meu olfato”, pensei. No portão  de entrada (aquele lugar aonde checam seu passaporte) Grandes mudras me cumprimentavam. “Isso que é boas vindas.” E o medo de me mandarem de volta? “Isso não!”

Ninguém me mandou de volta, após longo tempo a espera de um oficial carrancudo, bigogodudo e com sobrepeso que analisou meu passaporte e fez perguntas em um inglês inteligível, entrei. “Finalmente Índia.” Homens uniformizados portando enormes fuzis e cães de guarda para todo lado. “Desci em Guantánamo sem querer?” Não, os saris, bigodes, turbantes e gente branca usando uniforme de turista indicavam que eu estava no lugar certo.

Agora é só trocar meu dinheiro por algumas Rúpias e encontrar meu ônibus, que segundo o RH  estaria me esperando na saída do aeroporto, bus stop 1/2 (Harry Potter?). Mas tudo bem, segundo a Wikipédia e o Lovely Planet a Índia possui dois idiomas oficiais, o inglês e o híndi. “Mentirosos, bastardos.” Ninguém fala inglês!!!! E Agora? Com mímicas e repetições extenuantes da mesma palavra tudo se resolve.

Após andar a esmo de um lado para outro alguém aponta um lugar escuro, no meio da nevoa, longe da plataforma 1,  2 e da civilização. “Be brave Glísia” O que mais posso fazer? Vambora.

No lugar indicado uma galera de turbante e longas barbas aguardava. Peconceito eu? Com certeza, fiquei morrendo de medo daquele povo com cara de terrorista. “Glísia, open up your mind” afinal você não tem escolha. Apontando o impresso da passagem em minhas mãos perguntei a um rapaz se estava no lugar certo. Aprendi o meu primeiro ensinamento sobre a Índia, se você pede informação a uma pessoa, na verdade está pedindo a qualquer um que esteja a um km de distancia. A horda arrancou a passagem das minhas mãos, me circundou e começou a debater Híndi. “Eu quero a minha mãe!”, “Mantenha a  calma!”, “Mantenha a  calma!”

Após alguns segundos de pânico, aguém que fala algum inglês foi mobilizado.

– Punjab?

– Yes, LPU, Lovely Professional University, Jalandhar. Jalandhar, LPU.

– LPU?

– LPU!

– Here. Wait. You wait. Here. Bus!

Graças a Deus eu estava a salvo e no lugar certo.

– Where you from?

– Brazil!

– Brazil?

– Futbool

– Haaa, Braziiil!

“E não é que povo de turbante era super gente boa.

Depois de algum tempo congelando em meio a nevoa com meus novos amigos barbudos eis que chega o tão esperando balsamo, Indo Canadian Bus com uma enorme bandeira dos USA impressa na lataria. “Finalmente descanso” Sentei na primeira fila, perto do motorista. “Assim da para ver melhor a paisagem!”

Dentro do veículo, toda uma mini Punjab. Na televisão um vídeo com homens barbudos, de turbantes e roupas brancas cantando e tocando instrumentos dentro do templo dourado.  Ao lado do motorista um colar de flores amarelas circundavam a imagem do mesmo templo com todos os profetas/deuses siks ao redor, em frente um lindo tecido azul todo bordado com pequenas flores de lantejoula que formavam palavras em Híndi e canutilhos que caiam como uma longa franja na barra. E sim, todo esse lindo mural se encontrava na frente do motorista tampando parcialmente sua visão.

“Hora do descanso!!!!” Ledo engano. A buzina não parava. Estridente e potente o som ecoava em intervalos de segundos. E os sustos! Toda uma família atravessando a pista em frente ao enorme ônibus. O que fazer? Aperta buzina e acelera.

Gente, gente, muita gente. Lixo, esgoto, vacas, cães, vacas em meio ao lixo, gente ao redor do esgoto. Verdes plantações com casinhas espaçadas. Gente na pista, vaca na pista, riquixás. Um caminhãzinho passa lotado de passageiros, o ultimo a entrar provavelmente se arremessou em meio aos outros e agora se encontra em uma engraçada posição, com o corpo para dentro da carroceria, sobre seus companheiros e o traseiro para fora. Gente no topo dos ônibus. Cidades sujas. Feiras ao ar livre, frutas, pessoas, vacas e lixo. Senhor, quanta gente, quanta vaca e quanto lixo!

Dentro do ônibus um filme começa. Mais tarde descobri ser este um clássico do cinema Indiano. A legenda advertia: “A obra acerca do conflito entre Índia e Paquistão devido ao tamanho e tempo não pôde cobrir todos os fatos que ocorreram no período, tampouco todos os atos eróticos tomados por bravos guerreiro, bla, bla…”  Dormi. Três horas depois acordo, e choquem, o filme ainda estava na metade. Dediquei o resto da viagem mais ao filme que a paisagem por vezes caótica, por vozes bucólica que passava do lado de fora.

Na tela: amor, guerra, música, dança, muito exagero, um ator de bigode e olhar 43 aprecia o cigarro que segura entre o anular e o mínimo expelindo “sensuais”  e “másculas” baforadas. Tudo em Híndi, mas na língua universal de Bollywood  não é preciso entender o diálogo para entender a cena. Por fim meu destino LPU. Mas isso eu deixo para outro post.